O que primeiro chama a atenção no título do artigo é o adjetivo “injusto”. A pergunta que ele suscita é muito óbvia: injusto para quem? Para o jornal? Para quem pode pagar para estudar? Para quem não pode? Para os bancos particulares que lucrariam com programas de financiamento estudantil? Qual é a noção de justiça invocada aqui, afinal? Essas perguntas o editorial não responde. Ele só diz que “os alunos de renda mais alta conseguem ocupar a maior parte das vagas nos estabelecimentos públicos, enquanto aos pobres restam as faculdades pagas”, afirmação que desmente inadvertidamente.
Com essa platitude do senso comum, o autor inverte a lógica da injustiça social para jogar nas costas da universidade pública sucateada o ônus de problemas sociais que ela nunca criou ou perpetuou. Convenientemente, o editorial se omite sobre os interesses dos fundos de investimentos que esperam, há anos, a oportunidade de lucrar muito com planos privados de financiamento estudantil. Na verdade, o texto só transforma a universidade pública em bode expiatório para problemas gerados pela má-gestão política do dinheiro arrecadado pelos estados e pela União.
O editorial ainda sugere que a cobrança de tarifas dos alunos do ensino superior público automaticamente reduziria a carga tributária. Esse é um argumento falso, que confunde os leitores para que apoiem políticas que se voltariam contra eles. O texto silencia sobre o fato de que, na prática, as famílias com filhos em universidades públicas continuariam a ter a mesmíssima carga tributária pesada, à qual seria somado o custo extra de ter de pagar caro por algo que lhes é de direito. Por esse prisma, a proposta do editorial é injusta e oportunista.
O autor ainda defende seu argumento citando uma pesquisa da “Folha de São Paulo”, de acordo com a qual “60% dos alunos da USP poderiam pagar mensalidades na faixa das cobradas por estabelecimentos privados.” Em que condições eles poderiam pagar para estudar o editorial não menciona, ignorando as diferenças socioeconômicas na faixa que cria estatisticamente. Há, portanto, pelo menos dois problemas que invalidam esse exemplo. Um lógico-matemático e outro retórico.
Se lermos o exemplo ao contrário, perceberemos que chocantes 40% dos alunos da USP não poderiam pagar mensalidades, e jamais estudariam lá, ainda que merecidamente passassem no vestibular. Isso não é injusto? Assim, o editorial generaliza a questão do financiamento do ensino superior a partir de um único exemplo, sem fazer as devidas contextualizações. O autor simplesmente toma a condição financeira de pouco mais da metade dos alunos da USP como único parâmetro para propor uma reforma geral e se dá por satisfeito, embora saiba que a USP não é a nossa única universidade pública.
Em suma, se quisesse ser justo, como pretende parecer ser, o autor teria feito um levantamento extensivo da situação financeira dos alunos das universidades públicas brasileiras para saber quem realmente não pode pagar para estudar.
Fernando A. Poaiana
professor e músico
São José do Rio Preto -SP.
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