Herói ou vilão?    Bertolt Brecht e a crise de junho de 19531
Mark W. Clark

A CARREIRA de Bertolt Brecht na República    Democrática Alemã tem sido objeto de acirrada controvérsia    desde sua morte, em 1956. Para muitos, foi durante esse período que Brecht    abandonou o papel de intelectual independente para se tornar um funcionário    do partido. Hannah Arendt argumentou que ele "deixou de ser um poeta" durante    seus anos na RDA, sofrendo "a repentina perda daquilo que, ao longo da história    humana, tem figurado como um dom divino". Essa perda ele sofreu não quando    se tornou comunista, ou quando se recusou a romper com o comunismo durante os    Julgamentos de Moscou, e nem mesmo quando deixou de se pronunciar publicamente    sobre o Pacto Hitler-Stalin, mas apenas quando "se retirou para Berlim Oriental,    onde pôde ver, dia após dia, o que significava para o povo viver    sob um regime comunista" (Arendt, 1968, p.213-5). Theodor Adorno (1992, p.86)    classificou Brecht como um "apologista da cumplicidade", que defendeu não    um "socialismo imperfeito, mas uma tirania". Especialmente depois da insurreição    dos trabalhadores em 1953, quando Brecht apoiou publicamente as severas sanções    do regime, muitos críticos ocidentais o descreveram como um traidor intelectual    que tinha abandonado os próprios trabalhadores em nome dos quais ele    alegava falar (cf. Grass, 1966). 
 Alguns biógrafos recentes, entre eles    Ronald Hayman e John Fuegi, também fizeram ácidas críticas    aos atos de Brecht durante essa crise. Na única oportunidade de derrotar    a ditadura comunista e recuperar a liberdade, por covardia, oportunismo ou ambas    as razões, Brecht escolheu apoiar o regime stalinista de Walter Ulbricht.    Outros biógrafos foram mais compreensivos. Werner Mittenzwei, por exemplo,    descreveu Brecht como uma figura quase heróica. Motivado pela preocupação    com o incipiente estado comunista, ele defendeu a liberdade artística    opondo-se aos funcionários do partido e liderou ações contra    um regime ditatorial (Mittenzwei, 1986, v.II, p.482-541).2
 Informadas com demasiada freqüência    por suposições relativas à guerra fria e por uma concepção    construída a posteriori sobre quais eram as possibilidades naquele    contexto, essas interpretações não apresentam o quadro    mais nítido da carreira de Brecht na RDA, nem de suas ações    nesse momento de crise. Este artigo trata das reações de Brecht    aos desafios por ele enfrentados na recém-proclamada RDA e, mais especificamente,    na crise precipitada pelos fatos de 1953. Brecht era um tipo específico    de intelectual alemão, alguém que se posicionava entre sua experiência    de exílio no Ocidente, por um lado, e, por outro, sua convicção    de que o futuro da Alemanha estava em uma sociedade socialista que, após    o colapso do Terceiro Reich, só poderia ser garantida pela União    Soviética. À época de seu retorno à Alemanha, Brecht    concebia sua contribuição intelectual como uma mercadoria, no    sentido revolucionário do termo que ele havia desenvolvido em The    Three Penny Lawsuit [O processo dos três vinténs].    À medida que se ajustava às inconstantes realidades do incipiente    estado comunista, ele foi aprendendo a avaliar e exercitar seu valor de mercadoria,    trabalhando para construir uma nova cultura socialista sobre as ruínas    da antiga alta cultura. Ao mesmo tempo, ele ajudou a iniciar uma reavaliação    crítica da tradição cultural alemã e garantiu uma    sede permanente para o Berliner Ensemble.
 Desde a década de 1920, Brecht já    era um dramaturgo conhecido e um inte-lectual polêmico. Hostilizando a    antiga alta cultura alemã, ele buscou criar "uma arte nova, social e    antimetafísica", que se afastasse significativamente da tradição    burguesa do século XIX.3    Isso significava que a antiga alta cultura, com seu idealismo e elitismo, teria    de ser substituída por uma cultura especificamente moderna. Brecht (1964,    p.23) exigia "a transformação radical do teatro", que iria    "corresponder à inteira e radical transformação da mentalidade    de nosso tempo". Na década de 1920, juntamente com Erwin Piscator, ele    criou um teatro "épico" que se diferenciava do teatro "dramático"    ou "aristotélico". Enquanto a premissa do teatro dramático era    de que a natureza humana não podia ser mudada, o teatro "épico"    supunha que ela podia mudar e já estava mudando (Brecht, 1957, v.2, p.104).
 A radicalização da teoria teatral    de Brecht coincidiu com sua conversão ao marxismo. Na realidade, a idéia    de que o espectador deveria aprender a considerar o mundo como algo mutável    o ajudou a adaptar sua técnica literária a suas novas crenças    (Brecht, 1968a, p.79). À medida que ia se comprometendo mais com o marxismo    no final da década de 1920, sua atenção voltou-se mais    explicitamente para a política e a arte política, e ele gravitou    na direção do leninismo (Bunge, 1970, p.96-7). Ele chegou a aceitar    a necessidade da luta de classes, um conceito que se transformou em componente    principal de seu pensamento político e estético. Entretanto, no    início da década de 1930, ele também foi influenciado por    dois marxistas não-ortodoxos, Walter Benjamin e Karl Korsch. Este último    ajudou Brecht a entender a inter-relação entre arte e sociedade.    Ele fortaleceu em Brecht a esperança de que sua obra pudesse contribuir    para uma mudança social produtiva, e essa esperança foi central    para o desenvolvimento da técnica dramática de Brecht. Brecht    passou a ver que a realidade deveria ser representada de tal forma que o espectador    não se sentisse em casa, mas que assumisse uma posição    crítica em relação a ela, a fim de ser capaz de mudá-la.4    Benjamin ajudou Brecht a entender que o modernismo nas artes era compatível    com o marxismo.
 No início da década de 1930, Brecht    reinterpretou suas primeiras peças – incluindo a tão aclamada    Ópera dos três vinténs – através das lentes    do marxismo, e escreveu uma série de Lehrstücke (peças    didáticas), ou peças didáticas – que objetivavam ser modelos    de comprometimento político para as crianças. Essas peças,    em alguns aspectos demasiadamente simplistas em seu marxismo, fizeram de Brecht    um alvo dos nacional-socialistas e da polícia alemã. O arquivo    sobre Brecht em Berlim declarava que ele era um "dramaturgo e conferencista    comunista", embora não fosse oficialmente um "membro do partido" (Mittenzwei,    1986, v.1, p.357). Como resultado disso, Brecht foi colocado na lista negra    dos nazistas e fugiu da Alemanha um dia após o incêndio do Reichstag,    quando mais de quatro mil comunistas e intelectuais de esquerda foram detidos.
 Diferentemente de muitos de seus colegas comunistas,    Brecht fixou-se por um tempo na Escandinávia, e mais tarde nos Estados    Unidos. Viajou pela União Soviética em 1941, mas não permaneceu    ali, em parte porque temia que, tal como seus amigos Carola Neher e Sergei Tretiakov,    ele mesmo viesse a desa-parecer no Gulag.5    Brecht sempre teve uma atitude ambivalente em relação ao comunismo    soviético sob o comando de Stalin, e isso acabaria influenciando o modo    como ele se posicionaria na República Democrática Alemã.    Durante a década de 1930, ele disse a Benjamin: "Na Rússia, está    no poder uma ditadura sobre o proletariado", embora rapidamente acrescentasse    "não devemos repudiá-la enquanto essa ditadura ainda realizar    um trabalho prático pelo proletariado".6    Entretanto, ele nunca rompeu com a União Soviética nem a criticou    abertamente durante ou após seu exílio. Mesmo em particular, Brecht    era ambíguo em suas críticas (Lunn, 1982, p.77). Ao longo de toda    a sua vida, Brecht reconheceu várias das falhas do sistema socialista    liderado por Stalin, mas, como argumenta David Pike (1985, p.232), ele acreditava    que "os vícios residuais que infestavam o sistema eram superados por    suas virtudes historicamente garantidas e acabariam sendo vencidos por elas".    No entanto, em virtude de sua constante relutância em entrar para o partido,    e pelo fato de mais tarde Georg Lukács tê-lo classificado como    um "formalista", Brecht desenvolveu uma reputação de comunista    não-ortodoxo. Por um lado, sua reputação como uma voz independente    o fez objeto de suspeita, principalmente entre os stalinistas radicais; por    outro, essa mesma reputação o tornou mais aceitável para    muitos intelectuais de esquerda que nem sempre aprovavam o programa do partido.
 Foi durante seu exílio – seu período    criativo mais importante – que Brecht escreveu suas grandes peças, incluindo    Galileu, Mãe Coragem e A boa alma de Setsuan. Também    durante a década de 1930, Brecht refinou sua estética marxista,    opondo-se em parte a outros pensadores socialistas – particularmente Lukács.    A polêmica entre Lukács e Brecht dizia respeito a como tratar adequadamente    a tradição cultural e a teoria dramática. Enquanto Lukács    tinha atacado o modernismo e defendido a necessidade de um "realismo socialista",    estritamente definido, Brecht insistia em uma definição mais aberta.7    Lukács (1981, p.45-75) se concentrava no realismo do século XIX    e rejeitava o modernismo porque ele não tinha um senso de totalidade    e perspectiva, e, dessa forma, apenas refletia o caos e a alienação    do capitalismo. Além disso, como o modernismo era a expressão    de artistas de vanguarda, ele não conseguia atingir as massas. Lukács    atacava Brecht por ser um "formalista", por usar técnicas modernistas    como a montagem; ele criticava especialmente as Lehrstücke de Brecht    que, segundo ele, ficavam muito aquém do realismo.8
 Brecht respondeu a Lukács em uma série    de ensaios escritos para o jornal Das Wort, mas que só foram publicados    após a sua morte em 1956 (Knopf, 1984, p.491-4). Lukács, argumentava    Brecht, tinha ignorado as possibilidades realistas inerentes à arte moderna.    O realismo significava "desnudar a rede causal da sociedade / evidenciar o ponto    de vista dominante como o ponto de vista dos dominadores / escrever do ponto    de vista da classe que preparou as soluções mais abrangentes para    os problemas mais graves que afligem a sociedade humana / enfatizar a dinâmica    do desenvolvimento / e do concreto para encorajar a abstração"    (Brecht, 1964, p.107-9). Brecht defendia a experimentação artística    argumentando que a inconstante realidade social podia ser desmascarada usando-se    novas técnicas artísticas formais. Essas técnicas, que    incluíam a montagem e a alienação, não estavam mais    ligadas a uma classe do que estavam outras "forças de reprodução";    elas poderiam, dessa forma, ser usadas para objetivos progressivos (GKBA,    v.22.2, p.628-30). Era necessário "fazer um uso atraente de todos os    meios, tanto antigos quanto novos... para colocar a realidade viva nas mãos    das pessoas vivas, para que ela possa ser dominada".9
 A característica mais significativa da    arte no mundo moderno era sua condição de mercadoria. Como apontou    Brecht em seu ensaio "The Three Penny Lawsuit – A Sociological Experiment" ["O    processo dos três vinténs – um experimento sociológico"],    a arte não era um "fenômeno de natureza social independente, que    pode impor-se contra a sociedade", mas apenas outra "força produtiva".    "Uma obra de arte", afirmava ele, "assume imediatamente a forma de mercadoria    [commodity] ... aparece separadamente do inventor em uma forma determinada    pelas possibilidades comerciais do mercado". Sendo um "processo progressivo",    a condição de mercadoria poderia "ser afirmada desde que o progresso    seja concebido como o ato de avançar e não como o resultado passivo    desse avanço. Em outras palavras, a fase de commodity também    deve ser considerada superável, por sua vez, pelo avanço contínuo".    Brecht continuava mantendo, entretanto, que a arte, embora não privilegiada    no sentido tradicional, tinha de permanecer autônoma. A própria    arte tinha o poder de transformar uma determinada realidade, desenvolvendo o    pensamento dialético, desmistificando a realidade social e "antecipando"    um sistema socioeconômico alternativo (Silberman, 2000, p.50, 27, 51,    163, 179-80, 195; Brecht, 1968a, p.121-3).

À medida que Brecht foi refinando sua    estética, também desenvolveu uma concepção mais    clara do papel dos artistas e intelectuais na sociedade. Por muito tempo, ele    se opusera à suposição idealista de que os intelectuais    eram árbitros apolíticos dos valores universais (Zuckmayer, 1966,    p.379). Agora, sua crítica estava mais afiada, pois ele percebera que    intelectuais tinham sido cúmplices da ascensão dos nazistas ao    poder. Para Brecht, houvera apenas um tipo de intelectual no passado: o "reacionário"    ou intelectual burguês, que "se mesclava à classe dominante", comprometia-se    apenas com a arte pela arte, e servia apenas aos interesses da elite. Além    disso, os intelectuais burgueses tinham direta ou indiretamente apoiado o regime    semi-autocrático do Kaiserreich (Brecht, 1968a, p.86, 88, 90). Especialmente    problemática para Brecht foi a traição cometida pelos intelectuais    alemães durante a República de Weimar. Na opinião de Brecht,    os intelectuais – pelo menos os que tinham corrompido e malversado o intelecto    – eram em grande medida responsáveis pelo declínio da República    de Weimar e pela vitória dos nazistas.10    Embora inicialmente concebesse sua crítica dos intelectuais como um romance,    Brecht só completou o projeto em 1953, na forma de uma peça –    Turandot – e em circunstâncias muito diferentes (Knopf, 1984, p.399-418).    Entretanto, elementos de sua crítica podem ser encontrados em outros    lugares, incluindo as peças Galileu e Der Hofmeister, e    o conto "Das Experiment".
 Para Brecht, a situação daquele    momento exigia um tipo diferente de intelectual, um "intelectual revolucionário",    que livremente escolheria abraçar a "luta de classes". O intelectual    revolucionário deveria ser "dinâmico, político e fulminante"    para "esvaziar a ideologia burguesa", "intensificar a luta de classes" e "além    disso desenvolver a teoria em estado puro".11    Brecht também passou a compreender seu próprio papel de uma maneira    específica. Ele estava, como outros intelectuais de origem burguesa,    trabalhando em prol dos interesses do proletariado. Nesse ponto, existe uma    notável semelhança com a noção de Antonio Gramsci    (1971, p.6-22), segundo a qual, por um tempo "intelectuais tradicionais" devem    assumir os interesses do proletariado até que "intelectuais orgânicos"    originados das classes trabalhadoras possam suplantá-los. Em um registro    especialmente pungente de seu diário, escrito em 1940, Brecht observa:
As pessoas hesitam em chamar poetas como Hasek, Silone [O-Casey], e eu de burgueses, mas isso está errado. Nós podemos tornar nossas as preocupações do proletariado; por um certo período de tempo podemos até ser os poetas do proletariado... Em determinadas fases do desenvolvimento, quando o proletariado venceu mas ainda continua sendo proletário, a função do defensor burguês... será formalista. Depois disso, os novos poetas e soldados entram em cena. Eles encontram nas obras de seus predecessores – nossas obras – não só o meio mais altamente desenvolvido de expressão, mas também os elementos da nova cultura... Também importante em nosso trabalho é a técnica do novo começo, desenvolvida por aqueles que dominarem a tradição, porque o novo começo que não domina a tradição acaba facilmente dominado por ela. (Brecht, Arbeitsjournal, p.143)
Brecht entendeu melhor seu próprio papel    intelectual como uma mercadoria. As novas tecnologias do capitalismo tinham    alterado radicalmente a produção artística e, assim, descartado    as velhas concepções de "arte" e "gênio artístico".    O autor era "arrastado para o interior do processo técnico, [que é]    visto como produção de mercadoria" (Brecht, 2000, p.143). Embora    fosse consciente e profundamente orgulhoso da própria criatividade, Brecht    também reconhecia que seu trabalho e reputação tinham um    valor de mercado, e pensou muito sobre como instrumentalizá-los para    fins específicos – principalmente nos anos cruciais entre 1949 e 1953.
 Quando Brecht voltou à Zona Soviética    de Ocupação, estava numa situação singular. Sua    experiência no Comitê de Atividades Antiamericanas em 1948 tinha    fechado para ele todas as possibilidades na zona americana de ocupação.12    Entretanto, Berlim Oriental era especialmente atraente por vários motivos,    sobretudo pela oferta de ter seu próprio teatro e pela presença    de muitos amigos emigrados em quem ele confiava, entre eles Johannes R. Becher,    o principal agente cultural do governo de Berlim Oriental.13    Durante uma longa viagem pelo setor soviético de Berlim no final de 1948,    Brecht entabulou discussões com muitas das mais importantes figuras políticas    e culturais da Zona Soviética: Becher, Wolfgang Langhoff (diretor do    Deutsches Theater) e Alexander Dymschitz, agente cultural do governo    soviético. Apesar de algumas apreensões, durante essa visita ele    teve reforçadas suas certezas de que apenas a União Soviética    poderia garantir da melhor forma possível a Alemanha socialista com a    qual ele sonhava (Brecht, Arbeitsjournal, p.849). Sem dúvida,    ele ainda conservava sentimentos ambivalentes em relação ao comunismo    ao estilo soviético. Ele não tinha dúvidas de que iria    se opor a marxistas e stalinistas dogmáticos, e isso provavelmente lhe    trazia alguma ansiedade. Entretanto, Brecht também reconhecia que haveria    um grupo suficientemente grande de pessoas que pensavam como ele e que o ajudariam    a resistir aos mais dogmáticos, e ele sabia que sua reputação    era grande o bastante para protegê-lo. Apesar dos problemas e desafios,    talvez até por causa deles, esse foi um "ótimo período    para a arte" (GKBA, v.23, p.129).
 Quando Brecht retornou para a Alemanha, ainda    havia alguma abertura na vida cultural da RDA. Embora David Pike tenha argumentado    que a sorte estava lançada para uma ditadura ao estilo stalinista, e    também para as políticas culturais concomitantes, mesmo antes    da separação da Alemanha, Gerd Dietrich demonstrou que continuou    a existir algum espaço de manobra na política cultural até    meados da década de 1950, quando a situação política    tornou-se muito mais restritiva.14    Haveria janelas de oportunidades, especialmente em 1953, durante o desequilíbrio    que se seguiu à morte de Stalin.
 Desde o início da ocupação,    os soviéticos e o SED (Partido da União Socialista da RDA) tinham    reconhecido a importância da esfera cultural e dos intelectuais. Para    funcionários do governo, tais como Becher, era necessário extirpar    a intra-estrutura cultural do Nacional-Socialismo e reconstruir a cultura sobre    uma base democrática.15    Dessa forma, Becher ajudou a criar a Kulturbund zur demokratischen Erneuerung,    cujos objetivos eram "a produção ativa na área da literatura,    da ciência e da arte para a destruição intelectual e moral    do nazismo, a participação no renascimento intelectual do povo    alemão visando à democracia e ao progresso, o encorajamento da    pesquisa científica livre e de toda a vida cultural, a popularização    da herança clássica da vida intelectual alemã".16
 O desafio colocado para os intelectuais, bem    como as oportunidades disponíveis eram significativamente diferentes    em relação aos dos anos de exílio. Conseqüentemente,    Brecht começou a reconsiderar seu papel de intelectual. Ele não    produziu nenhum texto teórico durante esse período, mas refinou    ainda mais sua concepção de responsabilidade intelectual à    medida que respondia aos desafios do pós-guerra. Como Becher, Brecht    estava convencido de que os intelectuais tinham de desempenhar um papel decisivo    na transformação da Alemanha durante aquele momento de crise.    Esse processo exigia mais do que constituir um estado; exigia a criação    de uma comunidade, e a cultura era essencial para esse processo. Entretanto,    para que uma nova cultura socialista se desenvolvesse, deveria haver certa liberdade,    especialmente para artistas e intelectuais. Eles não podiam simplesmente    ser os porta-vozes da propaganda política do partido. Segundo Brecht    disse a Wolfgang Harich em 1951, a função da arte em um tempo    de luta era servir como propaganda do partido. Entretanto, "a exigência    das obras de arte para nós é ainda mais alta: conteúdo    e forma" (BBA, 1340/55). Essa visão o colocava em conflito com os dirigentes    do SED, mas Brecht nunca fugiu do conflito ou da crítica. Ele acreditava    que uma crítica eficaz era parte integrante da construção    de uma nova cultura socialista, por meio da qual os valores e as aspirações    da classe trabalhadora poderiam ser expressos.
 Brecht ainda acreditava que sua mais importante    contribuição era artística, e sua prioridade foi sempre    o teatro. No teatro ele poderia fazer a melhor contribuição para    uma nova sociedade e identidade socialista. Peter Huchel (1984, p.375, 151-2)    posteriormente relembrou que, para Brecht, "o teatro era a coisa mais importante;    pelo teatro ele fazia acordos". Mas ele também reconheceu que podia –    e devia – exercer um tipo mais direto de influência política    valendo-se de sua posição de agente cultural. Entretanto, ele    nunca desejou tornar-se um político profissional ou subordinar-se ao    aparelho do estado, o que na sua consciência lhe teria negado seu valor    de mercadoria. Gradualmente, à medida que ganhava experiência política,    Brecht foi descobrindo a melhor maneira de influenciar a política cultural    para conseguir o que queria. Isso geralmente significava trabalhar nos bastidores,    valendo-se de sua posição como membro da Academia das Artes, da    qual ele se tornou sócio-fundador em 1949.17    Era crucial que a Academia controlasse a produção artística    e a política cultural (GKBA, v.23, p.126). Embora geralmente    ele não estivesse disposto a criticar o partido abertamente em um fórum    público – e nunca estivesse disposto a criticar para o Ocidente as políticas    da RDA –, ele estava preparado para defender suas posições nas    questões cruciais, especialmente nos bastidores. Mas ele escolhia cuidadosamente    suas batalhas. Como afirmou Manfred Jaeger (1973, p.169): "Ele sabia que estava    no meio de uma revolução social, na qual desejava introduzir determinadas    mudanças – que eram difíceis mas não fúteis; arriscadas,    mas não impossíveis".
 O fato de Brecht ter recebido apoio estatal    para sua companhia de teatro imediatamente após a sua volta ilustra a    grande importância que os soviéticos e o SED lhe atribuíam.    Ele não causou desapontamentos. O Berliner Ensemble depressa se    tornou a principal atração e uma carta na manga – na verdade,    foi uma das pouquíssimas realizações culturais de toda    a República Democrática Alemã. Muito por causa de sua reputação    e o rápido sucesso de seu teatro, do qual a estréia de Mãe    Coragem em janeiro de 1949 em Berlim é apenas o exemplo mais destacado,    Brecht desfrutava de privilégios que não estavam disponíveis    para a maioria dos intelectuais da Alemanha Oriental – incluindo, no final,    um carro, duas casas e liberdade para viajar para fora da RDA. Ele também    se precatou, e manteve seu status de mercadoria, garantindo para si um    passaporte austríaco, uma conta em um banco suíço e um    editor na Alemanha Ocidental. Assim, ele tinha um grau de independência    que poucos outros possuíam. Entretanto, nem essas vantagens nem sua filiação    à Academia das Artes proporcionaram a Brecht plena liberdade na RDA.    Por exemplo, somente em 1954 sua companhia de teatro pôde ter uma sede    fixa, o Theater am Schiffbauerdamm. Além disso, estava sempre à    mercê da elite do partido para conseguir financiamentos estatais, distribuição    de ingressos e resenhas de suas peças nos jornais do partido.

Muitos membros do partido tinham fortes suspeitas    em relação a Brecht em virtude de sua reputação    de formalista e do fato de ele não ter passado o período do exílio    em Moscou. Entre seus mais eminentes críticos estava Walter Ullbricht,    que desconfiava dele e até recomendou a intelectuais como Wilhelm Girnus,    editor do jornal do partido Neues Deutschland, que ficassem de olho nele.    Mas Ullbricht também entendia que Brecht conferia credibilidade ao regime    e o tolerava razoavelmente. Brecht reconhecia isso e enfatizava sua reputação    internacional em todas as oportunidades, a fim de garantir e manter sua posição.    Outro opositor importante era Fritz Erpenbeck, editor do Theater der Zeit    e posteriormente diretor do Comitê Central do Programa do Ministério    para a Cultura Nacional. Erpenbeck manifestara essa sua disposição    em 1949, quando acusou Brecht de uma recaída na direção    do formalismo em Mãe Coragem. Entretanto, Brecht também    sempre teve amigos e aliados importantes no partido, dos quais o mais destacado    era Becher. Esse, juntamente com vários intelectuais como Wolfgang Harich,    ajudou a promover a carreira e as causas de Brecht. Na verdade, eles algumas    vezes chegaram a pôr em risco suas próprias carreiras para proteger    Brecht.
 Além do rápido triunfo de Mãe    Coragem, Brecht também alcançou outros sucessos, entre eles    a adaptação da peça de Jacob Lenz, Der Hofmeister –    sua primeira tentativa pós-guerra de avaliar a tradição    intelectual alemã. Brecht acreditava que para se transformar a Alemanha    teria de se distanciar de suas tradições mais antigas e malsãs,    especialmente a tradição intelectual, que ele acreditava ser em    grande medida responsável pela "miséria alemã". Ambientada    na Prússia e na Saxônia após a Guerra dos Sete Anos, a peça    examina a desastrosa carreira e a emasculação de um aspirante    a intelectual, Läuffer. De acordo com Brecht, Der Hofmeister era    uma sátira "do período em que a burguesia alemã construiu    seu sistema de educação" (GKBA, v.24, p.392). A história    não era "puramente simbólica; na realidade, a auto-emasculação    dos intelectuais é apresentada por meio de um exemplo de carne e osso...    A castração física não apenas significa a    auto-emasculação intelectual, mas é representada como uma    saída grotesca para a situação social de Läuffer"    (cf. Willett, 1990, p.491-2). Além de sua impor-tância histórica,    a peça mostrava por que os intelectuais alemães tinham sido incapazes    de resistir à ameaça nazista. Hofmeister estreou em 15    de abril de 1950 e foi bem recebida tanto no mundo oriental quanto no ocidental.    Paul Rilla (1950) observou que a peça era uma "interpretação    brechtiana" e não o Hofmeister de Lenz, mas mesmo assim era "uma    produção extraordinária e exemplar". Até mesmo Erpenbeck    teve uma impressão positiva.18
Se Brecht teve alguns sucessos, ele também    enfrentou reveses durante seus primeiros três anos na Alemanha Oriental,    entre os quais se destaca a produção da ópera Das Verhör    des Lukullus. Ambientada na Roma clássica, a trama gira em torno    do julgamento do general romano Lucullus, realizado no mundo dos mortos por    um camponês, um escravo, uma vendedora de peixe, um padeiro e uma cortesã.    Embora reconheçam as grandes vitórias do general, eles por fim    o condenam por ter sacrificado oitenta mil homens e o sentenciam a ser jogado    no precipício. A controvérsia em relação à    ópera girou em torno de duas acusações principais: pacifismo    e formalismo. Os funcionários do SED interpretaram a condenação    de Lucullus como uma condenação de guerra em geral, que não    fazia distinção entre guerras de defesa e guerras de agressão    – uma postura que, naquele momento, era inaceitável no bloco Oriental.    A acusação mais grave de formalismo se dirigia principalmente    a Paul Dessau, colaborador musical de Brecht. Mesmo antes da primeira encenação,    Ernst Meyer criticou severamente a ópera, relatando ao Secretariado do    Comitê Central que ela continha "todos os elementos do formalismo, exibidos    por meio da predominância de dissonâncias destrutivas e corrosivas,    e de um misticismo mecânico... A obra representa apenas a negação    da tradição clássica e da arte nacional".19
O debate sobre o formalismo chegou à Alemanha    Oriental em 1948 com um artigo publicado no Tägliche Rundschau e    escrito por Alexander Dymschitz, o principal funcionário do setor da    cultura da administração militar soviética.20    Em um esforço de definir o que seria uma arte nacional "aceitável",    os funcionários da Alemanha Oriental oficialmente entraram no debate    sobre o formalismo durante o terceiro congresso do SED, em 1950. Depois de iniciada    a Campanha do Formalismo, só havia duas possibilidades: ou a arte se    enraizava no solo nacional ou ela era estrangeira e, portanto, decadente. Em    um artigo publicado em novembro de 1951, N. Orlow alegava que todo formalismo    era "vazio de conteúdo positivo" e, portanto, prejudicial ao povo da    RDA. Segundo Orlow, o povo necessitava de "uma cultura que tornasse claramente    compreensível a luta histórica do povo alemão e do mundo    inteiro pela abolição da escravidão e da exploração".    Ele exigia que "toda influência da decadência ocidental... fosse    combatida".21
 Na RDA, a acusação de formalismo    estava intimamente ligada à acusação de cosmopolitismo,    e a luta contra ambos tornou-se parte do nacionalismo comunista da Alemanha    Oriental. De acordo com Ernst Hoffmann, membro do Comitê Central do SED,    o cosmopolita era "cinicamente desdenhoso" de todas as obrigações    morais e deveres nacionais. É alguém que está disposto    "a matar os trabalhadores de todos os povos e a transformá-los em objetos    abstratos e esquemáticos de exploração, a arrancá-los    de suas conexões com seu povo e sua classe, a roubar deles suas características    nacionais".22 Como observou    Jeffrey Herf, o nacionalismo comunista, com seu foco no futuro, também    "andava lado a lado com a tarefa de aliviar os alemães do peso de seu    difícil passado" (apud Herf, 1997, p.110). Para os intelectuais, isso    significava esquecer o passado recente e retornar, de uma forma hagiográfica,    aos clássicos da tradição cultural alemã, entre    eles Goethe, Bach, Heine e outros.
 Inextricavelmente ligado com a tentativa do    SED de consolidar seu poder estava o gradual estreitamento de possibilidades    na esfera cultural. A cultura precisava promover o estado, servir de instrumento    de propaganda para a política do estado. Com o intuito de controlar a    cultura de um modo mais completo, e de liderar o ataque contra o formalismo,    o partido criou novas instituições, das Amt für Literatur    e die Staatliche Kommission für Kunst, em 1951. Qualquer forma    de arte que fosse considerada oposta às restrições impostas    era considerada formalista e cosmopolita, e ser rotulado de formalista ou cosmopolita    significava estar ligado ao Ocidente – acusação especialmente    perigosa nesse contexto.23
 Dessa forma, as acusações contra    Lukullus foram graves e Brecht e Dessau ficaram em uma posição    precária. Dessau queria recuar após as primeiras reações,    mas Brecht era contra ceder tão depressa. O material, dizia ele a Dessau,    era especialmente importante naquele momento, quando "as ameaças americanas    são tão histéricas". Além disso, dizia Brecht, a    "crítica nunca deve ser temida; devemos rebatê-la ou aceitá-la,    só isso" (Arbeitsjournal, p.943). Depois de ter sido concedida    a permissão para uma estréia com uma platéia rigorosamente    controlada, realizou-se uma discussão formal sobre a ópera e os    problemas gerais da arte formalista. Durante essa discussão, Brecht não    recuou. Defendeu não apenas a ópera em si, mas também a    necessidade de liberdade artística. Dias depois, Wilhelm Pieck "convidou"    Brecht e Dessau para uma "discussão pessoal" em seu apartamento. Também    estavam presentes Otto Grotewohl, Paul Wandel, Anton Ackermann e Hans Lauter    (Pieck to Brecht, 20 March 1951, BBA, 135/12). Infelizmente, não restou    nenhum registro dessa reunião, mas a ópera foi suspensa até    que mudanças adequadas pudessem ser feitas. Embora em particular discordasse    das exigências e continuasse a defender a si mesmo, a ópera e Dessau,    em reuniões oficiais e cartas particulares, Brecht dessa vez curvou-se    aos desejos da elite do partido (cf. Willett, 1990, p.500). Ele e Dessau    fizeram várias alterações importantes, que o partido aceitou.24
 As anotações e a correspondência    particular de Brecht indicam que ele entendia que o debate sobre o formalismo    e o cosmopolitismo era parte do processo de consolidação do poder    na nova RDA. O próprio termo "formalismo" estava sendo empregado de uma    forma tão vaga que podia significar qualquer coisa e nada ao mesmo tempo.    Brecht comentou com Käthe Rülicke, sua assistente e amante, que Orlow    e outros nunca haviam nem mesmo oferecido uma definição do termo.    Eles diziam apenas que o formalismo devia ser "combatido" (BBA, 1340/45). Sem    dúvida, havia razão suficiente para uma oposição    ao formalismo, mas a "luta contra o formalismo deve ser dirigida tanto contra    a liquidação das formas quanto contra sua predominância".    A arte socialista adequada não devia se opor a todas as novas formas,    mas apenas "àquelas formas que distorcem a realidade", e deve favorecer    os "impulsos que promovem o socialismo" (BBA, 1340/89). A frustração    de Brecht se devia, em grande medida, ao que ele considerava ser uma desnecessária    intromissão dos burocratas do partido nos assuntos culturais. Como relatou    Rülicke, "Brecht não deseja aprender com Ulbricht como poetizar,    mas são os políticos que devem aprender dos poetas, que representam    a sociedade inteira... Os políticos não podem dizer nada sobre    as formas artísticas!".25
 Brecht, entretanto, acreditava que a RDA ainda    estava em uma fase de transição. Como relembrou Peter Huchel (1984,    p.375), Brecht "via a RDA como um grande canteiro de obras que ainda precisava    de muito trabalho". Um dos problemas era que a RDA ainda não tinha se    livrado dos vestígios dos padrões tradicionais de pensamento.    "É um grande azar da nossa história", escreveu Brecht em 1951,    "que devamos realizar a construção do novo sem ter realizado a    demolição do antigo. Provavelmente por esse motivo, olhamos para    a construção [do novo] de uma forma que não é dialética.    [Assim] não podemos expressar de forma adequada a luta diária    contra o antigo que ainda temos de realizar" (GKBA, v.17, p.103).
 Em 1953, uma confluência de acontecimentos    políticos e culturais ofereceu a Brecht uma condição propícia    para a realização de seus objetivos: uma sede permanente para    seu teatro e a restauração da autonomia nas artes, para que uma    cultura genuinamente socialista pudesse surgir. Começando no verão    de 1952, o regime de Ulbricht vinha tentando acelerar a transformação    da RDA na direção do socialismo, e esperava-se a adesão    da elite cultural.26 Não    haveria mais nem mesmo uma liberdade artística limitada. Em fevereiro    e março de 1953, Hanns Eisler e Brecht foram atacados em virtude de seu    tratamento do tema de Fausto. Objeto de discussão tanto na Alemanha Oriental    quanto na Ocidental, especialmente após a celebração do    bicentenário de Goethe, o tema de Fausto foi diretamente ligado à    tentativa de encontrar uma tradição cultural utilizável.    A figura de Fausto proporcionou a Brecht, dessa forma, a oportunidade de lidar    com dois dos seus temas mais importantes durante o período pós-guerra:    a tradição cultural burguesa e o relacionamento entre os intelectuais    e a sociedade.

Embora a produção do Urfaust    de Goethe realizada pelo Berliner Ensemble não fosse de grande importância,    Brecht participou das discussões dramatúrgicas no Berliner Ensemble    e as coordenou. Ali, ele expôs seu ponto de vista sobre a figura de Fausto    que, como Läuffer, era um símbolo do intelectual tradicional da    Alemanha. Não mais um grande herói, o Fausto de Brecht representava    a "decadência burguesa" e era um intelectual traidor de seu povo. De acordo    com Brecht, Fausto era "um parasita; ele absorve o conteúdo de livros    e do conhecimento até ficar farto. Vive do que eles lhe oferecem, mas    nunca paga". Homens como ele "não produzem nada; apenas tomam dos outros"    (BBA, 1340/27).
 Ao mesmo tempo, Eisler estava compondo a ópera    Johann Faustus. Ele desenvolveu uma concepção própria    da figura de Fausto em colaboração com Brecht, que retrabalhou    o texto para a ópera (GKBA, v.27, p.333). Esses dois trabalhos    foram discutidos na Academia das Artes no início de 1953. Como aconteceu    com Lukullus, as acusações eram de formalismo, cosmopolitismo    e difamação do "herói nacional". Alexander Abusch, importante    membro do conselho da Academia das Artes e ele mesmo uma vítima recente    do regime de Ulbricht, foi particularmente crítico, assim como Johanna    Rudolph, e escreveu que Brecht e Eisler "deveriam ter em mente a situação    em que o povo alemão se encontra... Fausto representa o melhor    do povo alemão. A defesa dessa grande criação de nossa    cultura nacional... deveria ser o desejo de todos os escritores humanistas".27
 Pelo ano de 1953, qualquer crítica feita    à tradição clássica alemã era considerada    pela elite do partido um ataque à RDA, que estava tentando forjar uma    identidade de "democracia popular" alinhada com desenvolvimentos culturais e    políticos progressivos anteriores. Assim, o regime não só    censurou Eisler e Brecht, mas também outros intelectuais dissidentes    que desviavam da norma, incluindo o editor do Sinn und Form, Peter Huchel.    O Sinn und Form, idealizado por Becher, era o porta-voz literário    da Academia das Artes (BBA, 795/24). Huchel, que não era membro do partido,    sempre mantinha um alto grau de independência e freqüentemente entrava    em conflito com o SED. No final de 1952, ele publicou tanto o libreto de Johann    Faustus quanto um ensaio crítico sobre Faustus, de autoria    de Ernst Fischer. Esse tipo de independência não podia mais    ser tolerado. Dessa forma, o partido resolveu derrubar Huchel e fechar o jornal.    Na reunião do conselho da Academia realizada em 13 de maio de 1953, foi    tomada a decisão de "preparar a extinção do jornal Sinn    und Form e a demissão do editor-chefe Peter Huchel" (Hecht, 1997,    p.1057). Huchel foi informado em 2 de junho de que estava sendo transferido    e, sob enorme pressão, concordou em afastar-se. Furioso, Brecht implorou    a Huchel que "protegesse" sua "posição, assim como eu protejo    a minha". Em uma declaração que mostra claramente como Brecht    entendia bem sua própria instrumentalização, ele apontou    que o Sinn und Form, juntamente com o Berliner Ensemble, eram "os melhores    cartões de visita da RDA".28
 Foi também durante esses poucos meses    que a ópera de Eisler foi intensamente bombardeada. Girnus, juntamente    com os funcionários do setor cultural Heinz Kamnitzer e Hans Rodenberg,    foi particularmente crítico. Brecht e Arnold Zweig defenderam a ópera.    Depois de suas discussões em reuniões fechadas da Academia, Girnus    publicou um artigo no Neues Deutschland no qual atacava o Johann Faustus    de Eisler por seu formalismo.29    Abusch também publicou um ensaio em que atacava a ópera por retratar    os intelectuais como "traidores" das forças progressivas da história    alemã. Enquanto o Fausto de Goethe era "um grande herói positivo    do drama alemão", e um predecessor direto do realismo socialista, o Faustus    de Eisler tinha "traído" suas raízes camponesas (Abusch, 1953,    p.179-94).
Eisler, que era membro do partido, enfrentou    não só a censura, mas também foi ameaçado de prisão    ou exílio. Durante as reuniões de maio e junho da Academia, Brecht    defendeu Eisler e, em termos mais genéricos, a necessidade de liberdade    artística (Heiser-Duron, s. d.). Ele também partiu pessoalmente    para o ataque, criticando a política cultural da RDA. Em fevereiro, ele    defendeu Eisler perante Hans Mayer:
Mais uma palavra sobre o "negativismo" que determinadas pessoas... atribuem ao Fausto de "Eisler". Com certeza um desejo justificado de ver heróis (modelos) positivos não deve nos levar a rejeitar o retrato de grandes figuras como Fausto, cuja influência pode ser igualmente positiva no sentido social. A literatura mostra que a tragédia pode desempenhar algumas das funções da comédia, um certo esclarecimento social, quero dizer. (cf. Willett, 1990, p.514)
A ópera de Eisler, alegava Brecht, era    "uma obra literária importante por causa de seu grande tema nacional,    por causa do nexo conceitual, por causa de sua linguagem, por causa da riqueza    de suas idéias". Em uma reunião oficial fechada no dia 27 de maio    de 1953, Brecht concordou que a história alemã "não pode    e não deve ser representada negativamente", mas, acrescentou ele, Eisler    concordava com seus críticos nesse ponto. Na opinião de Brecht,    Eisler tinha "feito uma contribuição positiva para o grande problema    de Fausto".30 Eisler entendia    a grande importância do apoio de Brecht naquele momento. Como ele escreveu    à esposa em 28 de maio, "Brecht apresentou teses brilhantes acerca e    a favor do Faustus". Entretanto, observou ele, elas foram "ineficazes"    (Eisler, 1985, p.278). Por fim, a oposição a Eisler ficou forte    demais. Em meados de junho, sob pressão pesada, ele partiu de Berlim    Oriental para Viena, onde permaneceria até fevereiro de 1954.
 Embora o formalismo ainda estivesse em questão,    o contexto político era diferente em 1953 do que tinha sido em 1951.    Mudanças importantes estavam ocorrendo na liderança do SED durante    a primavera e o início do verão de 1953, mudanças que culminaram    na insurreição de 16 e 17 de junho. A liderança tinha tentado    acelerar a transformação da vida política e social em 1952    com várias reformas. A mais controversa durante 1953 foi a proposta de    aumentar as normas de trabalho em 10%, uma exigência que gerou enorme    descontentamento entre os trabalhadores. A tarefa de sancionar as novas normas    tornou-se ainda mais difícil quando Moscou informou Ulbricht que desaprovava    a política do SED. Beria, chefe da polícia secreta da URSS e aparentemente    o herdeiro indiscutível de Stalin, fez ácidas críticas.    Moscou também estava passando por rápidas mudanças após    a morte de Stalin em março de 1953. A liderança soviética    empreendeu um "Novo Curso", que incluía uma medida de descentralização    política e um enfoque na produção de bens de consumo. Na    Alemanha Oriental, havia naturalmente uma grande dose de incerteza política    e partidarismo. No início de junho, Ulbricht, Grotewohl e Oelbner    foram chamados a Moscou para serem informados sobre a nova política do    partido.
 Em 9 de junho, o Politburo da Alemanha Oriental    fez um comunicado oficial admitindo "alguns erros" e aceitando uma mudança    de curso imposta pelos soviéticos. O aumento das normas de trabalho,    entretanto, não foi nem sequer mencionado. O comunicado oficial foi publicado    no dia 11 de junho no Neues Deutschland. Exasperados diante da manutenção    do aumento das normas, os trabalhadores enfrentaram funcionários do partido    e instituíram "operações tartaruga" e fizeram protestos    a partir de 12 de junho. A tensão continuou a aumentar, e no dia 16 de    junho os funcionários do setor da construção marcharam    até a sede do sindicato para fazer uma manifestação. Eles    exigiam um encontro com Ulbricht e Grotewohl, mas só conseguiram conversar    com o ministro da Indústria Pesada Fritz Selbmann e Robert Havemann,    presidente do Conselho de Paz da RDA. Os trabalhadores exigiam a retirada das    novas normas e, insatisfeitos com a resposta, convocaram uma greve geral. No    início da manhã de 17 de junho, os trabalhadores exigiram não    só a retirada das normas de trabalho, mas também uma queda nos    preços, eleições livres e a renúncia do governo.    Essas exigências não obtiveram nenhuma ou quase nenhuma resposta    das autoridades, e causaram mais frustração e, por fim, violência    (Ostermann, 2001, p.160ss). Ao anoitecer de 17 de junho, tanques e tropas soviéticas    haviam tomado a cidade e restaurado a ordem.
 Embora algumas mudanças políticas    tenham sido implementadas na esteira dessa insurreição, entre    elas a anulação do aumento das normas de trabalho, Ulbricht, que    se viu em risco de perder poder, respondeu com sanções severas.    A liderança do partido prendeu mais de seis mil pessoas envolvidas na    insurreição, incluindo não apenas grevistas e líderes    do movimento, mas também milhares de membros do SED que não concordavam    com a política do partido. Além disso, houve um expurgo de membros    das facções dissidentes da liderança do SED, incluindo    o ministro da Defesa Wilhelm Zaisser, o ministro da Justiça Max Fechner    e Rudolf Herrnstadt, editor do Neues Deutschland.
 Brecht, cuja reação às    sanções governamentais tem sido alvo de acalorada controvérsia,    entendeu que aquele era um momento crucial e aproveitou a oportunidade para    iniciar algumas mudanças importantes na política cultural. Käthe    Rülicke, que esteve ao lado de Brecht quase constantemente durante essa    crise, registrou que ele ficou "profundamente perturbado" e até "deprimido"    porque "logo na Alemanha, que já havia experimentado o fascismo, os trabalhadores    (e tratava-se de trabalhadores) foram se posicionar contra o primeiro    governo de trabalhadores". Brecht era solidário com os trabalhadores,    mas acreditava que "tudo deve ser feito para evitar outra catástrofe"    (BBA, 2164/05-06). Em público, Brecht nada dizia sobre a insurreição,    mas escreveu cartas de apoio tanto para Ulbricht e Grotewohl como para o funcionário    soviético Vladimir Semyonov. Para Ulbricht ele escreveu:
A história vai prestar suas homenagens à impaciência revolucionária do Partido da União Socialista da Alemanha. A grande discussão [diálogo] com as massas sobre a velocidade da construção socialista vai conduzir a uma visão e a uma proteção das realizações socialistas. Neste momento, devo expressar minha fidelidade ao Partido da União Socialista da Alemanha.
A penúltima frase continha a sugestão    de Brecht para que houvesse uma discussão dos erros cometidos pela liderança    do partido, em vez de mais opressão, e indica até que ponto Brecht    continuaria protestando em particular contra a opressão, mesmo tendo    de disfarçar seu protesto em meio a garantias de lealdade. Tendo em vista    que Brecht era extremamente cauteloso em termos pes-soais, a frase para Ulbricht    é notável. Para Semyonov, ele declarou sua "inabalável    amizade pela União Soviética" (Brecht, 1981, p.1793, 1795; BBA,    7/07).
 Embora, em particular, estivesse disposto a    dar apoio ao regime, Brecht estava menos disposto a fazer isso publicamente.    No dia 17 de junho, em uma reunião especial do conselho da Academia das    Artes, Abusch e Rudolf Engel sugeriram que a Academia publicasse um "manifesto"    que servisse como uma "declaração de apoio" ao regime. Brecht    recusou a idéia. Aquilo era impossível, disse ele, porque os presentes    não podiam falar por toda a Academia. Além do mais, como o regime    não tinha tomado uma posição oficial, era impossível    para a academia "responder a uma resposta inexistente". Brecht argumentou que    "uma simples declaração de apoio naquela situação    seria errada". Em vez disso, deveria ser iniciado um projeto mais significativo    de longo prazo, um projeto que envolvesse "a participação ativa    da Academia e a reforma da vida cultural" (DAK, 18/35-6).
 Alguns dias depois, em 21 de junho, apenas a    última linha da carta de Brecht para Ulbricht foi publicada no Neues    Deutschland. Naturalmente desgostoso por a carta ter sido publicada sem    a sua autorização, ele ficou furioso porque sua sugestão    de um debate sobre os erros tinha sido omitida. Ele entendia que isso poderia    manchar sua reputação no exterior, especialmente na Alemanha Ocidental,    e ele não podia perder seu valor de mercadoria naquele momento. Por intermédio    de Peter Suhrkamp, ele ficou sabendo que, depois de sua "declaração    de lealdade", os teatros do lado ocidental estavam se recusando a encenar suas    peças.31 Ele protestou    para Gustav Just, editor do Sonntag, dizendo que aquele ato tinha sido    "indelicado, pois ninguém havia discutido com ele a publicação    naquele formato". Além disso, seria "prejudicial" para sua obra, que    se destinava a toda a nação alemã.32
 Quase imediatamente, Brecht começou a    tentar reparar o dano e oferecer um quadro mais claro de sua posição.    Em 23 de junho, ele publicou uma declaração, juntamente com Slatan    Dudow, Wolfgang Langhoff e outros, na qual expressava sua esperança 
de que os trabalhadores, que fizeram uma demonstração motivados por uma insatisfação justificada, não fossem colocados no mesmo nível de agentes infiltrados que trabalhavam para insuflar a desordem, para que a urgente e necessária discussão sobre os erros cometidos de todos os lados não se torne impossível antes mesmo de começar.33
Enquanto isso, nos bastidores, em reuniões    da Academia Alemã das Artes e do Berliner Ensemble, ele começou    a fazer um movimento pela reforma da política cultural. Embora pudesse    não concordar com as ações dos trabalhadores, certamente    ele conseguia entender as queixas deles. A questão era criar uma sociedade    sem classes. Portanto, era necessário reconhecer o abismo entre os fatos    da vida como ela realmente era e o objetivo desejado. Esse abismo não    podia simplesmente ser negado ou ignorado sem que se abandonassem os princípios    do próprio marxismo. Durante as semanas que se seguiram a 17 de junho,    Brecht participou de várias discussões sobre a situação    daquele momento e a necessidade de mudar a política cultural. Em uma    reunião do Berliner Ensemble que ocorreu nos dias 24 e 25 de junho, ele    argumentou que "nos estágios iniciais tratava-se de uma questão    grave e chocante que até mesmo os trabalhadores estivessem fazendo demonstrações    aqui". Eles tinham "todas as justificativas" para proceder assim, mas elementos    nazistas também estavam em ação. Na opinião de Brecht,    era "um dos principais erros do SED e do regime que esses nazistas... não    tenham sido destruídos". Além disso, "era um erro... que fosse    tabu... falar da era nazista". Apenas a "magnífica cultura do povo alemão,    apenas o que era positivo" era mencionado. Esse era um dos principais pontos    da "discussão supérflua sobre o texto de Faustus". Do ponto de    vista de Brecht, "toda a gangue nazista ainda está presente; ela não    governa mais, mas está ainda muito viva espiritualmente". Mas ninguém    deveria falar sobre isso; esse assunto deveria ser "silenciado" (BBA, 1447/102).    Fazia sentido dizer, portanto, que grande parte da crise tinha sido precipitada    pela política cultural do SED. "A política cultural", escreveu    ele, "teve resultados desastrosos" (BBA, 1447/119).
 Se Brecht reconhecia que o regime tinha cometido    erros, ele também acreditava que os excessos de 16 e 17 de junho eram    em parte resultado da provocação de elementos fascistas dentro    da Alemanha Oriental, bem como de agentes da parte ocidental infiltrados. Como    escreveu ele a Suhrkamp:
O Partido da União Socialista cometeu erros que foram extremamente graves... e que despertaram a revolta de alguns trabalhadores... Mas eu respeito muitas de suas realizações históricas, e me senti alinhado com o partido – não por causa de seus erros, mas em virtude de suas boas qualidades – quando ele foi atacado por uma corja fascista e belicosa... Você pergunta sobre minha atitude em relação aos eventos de 16 e 17 de junho... Será que fui indiferente, para não dizer hostil, a uma insurreição popular, será que fiquei contra a liberdade quando, em 17 de junho, em uma carta ao Partido da União Socialista, cuja última sentença foi publicada, eu expressei minha prontidão em contribuir de minha própria forma (na forma artística) para o debate absolutamente indispensável entre os trabalhadores e o governo? Há três décadas tenho tentado em meus textos defender a causa dos trabalhadores. Mas na noite de 16 e na manhã de 17 de junho eu vi o movimento de manifestação dos trabalhadores degenerar em algo muito distante de uma tentativa de conquistar a liberdade. Os trabalhadores tinham motivo para se sentir amargurados. As medidas infelizes e pouco inteligentes tomadas pelo governo em uma tentativa de precipitar o desenvolvimento da indústria pesada na RDA enfureceram igualmente camponeses, artesãos, comerciantes, trabalhadores e intelectuais... Essas medidas... levaram os trabalhadores às ruas e os fizeram esquecer as indiscutivelmente grandes vantagens que a expulsão dos junkers, a socialização da indústria de guerra de Hitler, a produção planejada e o esmagamento do monopólio burguês da educação tinham trazido. Entretanto, já nas primeiras horas do dia 17 as ruas exibiam uma mistura grotesca de trabalhadores não somente com todos os tipos de jovens desclassificados, que se infiltravam pelo Portão de Brandemburgo, derramavam-se na Potsdamer Platz e formavam colunas através da Ponte de Varsóvia, mas também com figuras grosseiras e embrutecidas da era nazista, o produto local... [elementos] que estavam aqui o tempo todo. Os slogans mudaram depressa. "Abaixo o governo" foi seguido de "Todos para a forca"; a ralé dominou a cena... Por várias horas, até que as forças de ocupação entraram, Berlim esteve à beira de uma terceira guerra mundial. (cf. Willett, 1990, p.517-8, itálicos no original)
Embora Brecht tenha, sem dúvida, exagerado    o papel dos agentes ocidentais infiltrados e a gravidade da situação,    não se tratava apenas de mera encenação. Brecht    acreditava verdadeiramente que a nova sociedade socialista que esperava construir    tinha sido colocada em risco por elementos externos e internos. A crise    devia-se em parte a erros cometidos pela liderança do SED, o que incluía    seu fracasso em lidar de forma adequada com seu passado recente, em eliminar    todos os vestígios do nazismo, mas também resultava de elementos    fascistas da Alemanha. Não fica claro se Brecht chegou a reconhecer em    que medida sua posição a esse respeito era influenciada pela propaganda    política da União Soviética e da Alemanha Oriental. Entretanto,    é evidente que sua decisão de apoiar o regime foi motivada, em    parte, por seu desejo de melhorar a nova sociedade socialista que estava sendo    construída na RDA – o que incluía expulsar seus elementos fascistas.    Também era crucial, entretanto, o retorno da autonomia nas artes. Brecht    não argumentava em favor de uma liberdade artística absoluta.    Como ele ressaltou, "não se pode criar uma república de artistas,    onde cada um possa produzir o que bem entender. Não especialmente em    uma Alemanha que sofreu duas décadas de domínio nazista" (BBA,    1447/121). Não obstante, como ele escreveu em seu poema "Não o    que foi desejado", era preciso "libertar a expressão artística    sob o controle dos burocratas tacanhos".34
 Motivações profissionais e pessoais    também influíram no pensamento de Brecht nesse momento. Essas    preocupações e interesses diferentes sempre estiveram presentes    no Brecht pós-guerra, mas em configurações e proporções    que se alteravam. No momento em questão, seus interesses pessoais, profissionais    e ideológicos convergiram. Ele reconheceu que, finalmente, poderia conseguir    uma sede permanente para sua companhia teatral, mas também sabia que    o teatro seria de pouco valor, ao menos que ele tivesse algum controle artístico.    Dessa forma, Brecht começou a usar várias táticas para    forçar a mudança e, ao mesmo tempo, obter o Theater am Schiffbauerdamm.    Ele várias vezes enfatizou seu prestígio internacional e sua reputação    doméstica. Também se valeu de seus relacionamentos com intelectuais    importantes e funcionários do partido – e talvez esse tenha sido o aspecto    mais importante. Como apontou Meredith Heiser-Duron (s. d., p.52), ele "trabalhou    de forma auspiciosa com uma improvável combinação de quatro    pessoas", a saber: "Johannes Becher, Otto Grotewohl, Paul Wandel e Wilhelm Girnus".    Nos bastidores, ele fez uma pressão ainda maior por mudanças nas    políticas culturais, e convenceu essas e outras personalidades culturais    a apoiar seus planos, embora se recusasse, com poucas exceções,    a "manifestar publicamente" suas críticas sobre as políticas culturais.
 Em reuniões fechadas, ele pressionava    a Academia das Artes para que lançasse sugestões de mudanças    nas políticas culturais. Em 12 de julho, a Academia, depois de enfrentar    muita resistência por parte de Grotewohl e de outros, conseguiu publicar    uma lista de dez "sugestões", a maioria das quais se destinava a devolver    um grau de autonomia aos artistas. Entre as sugestões mais importantes,    estava a de que os artistas ficassem responsáveis pela produção    e publicação de suas obras. Além disso, era necessário    que a Academia tivesse voz na escolha dos "mais importantes indivíduos    responsáveis pelas questões artísticas". Finalmente, a    Academia declarou que "os eventos de 17 de junho" tinham provado que "a luta    contra o fascismo em todas as suas formas deve ser empreendida de novo e com    renovado vigor – até mesmo pelos artistas".35    Todas essas sugestões trazem, sem dúvida, a marca de Brecht, e    um exame cuidadoso dos protocolos sugere que ele foi muito influente em seu    desenvolvimento. Ninguém na Academia possuía a combinação    de dotes intelectuais e políticos que Brecht apresentava. Por esse motivo,    ele foi seu líder natural nesse momento.
 Brecht também continuou a lutar por sua    causa, o Theater am Schiffbauerdamm. Repetidas vezes enfatizou diante do partido    a sua importância como dramaturgo internacionalmente reconhecido. Em 15    de junho, mesmo antes da insurreição, ele tinha escrito a Grotewohl:    
Você provavelmente ouviu falar dos boatos mais estranhos que têm circulado na Alemanha Ocidental sobre atritos entre mim e o governo da República Democrática Alemã. Se o Berliner Ensemble, que é conhecido muito além das fronteiras da Alemanha, assumisse o Theater am Schiffbauerdamm, minha solidariedade com nossa república ficaria evidente para todos. (cf. Willett, 1990, p.515)
Embora Brecht em geral se recusasse a criticar    o regime em público, nessa época ele publicou dois poemas que    o criticavam. Seu duplo objetivo era destruir Das Amt für Literatur e Die    staaliche Kommision für Kunst e substituir essas duas organizações    por um ministério da cultura, liderado por seu amigo Becher. Em uma conversa    particular com Wolfgang Harich, influente filósofo e jornalista – e também    um de seus mais próximos aliados durante esse período –, Brecht    revelou muito acerca de seus planos. Harich sugeria que eles seguissem o exemplo    de Tito na Iugoslávia. Brecht respondeu:
Você está louco. Você vai acabar na forca... De qualquer forma, eu não quero saber de nada sobre a briga entre os partidários de Tito e os stalinistas... Minhas peças deveriam ser representadas em Moscou e em Belgrado. Por esse motivo, não vou me juntar a um partido. Sou a favor do comunismo em geral, mas não a favor dessas formas individuais: Stalin-Tito, para mim é tudo a mesma coisa... Queremos fazer algo real. Queremos nos livrar dos burocratas da política cultural. Você escreve um artigo contra aquele determinado artigo e eu acrescento alguns poemas e depois nós colocamos Johannes R. Becher como ministro da cultura.36
O artigo de Harich, que foi publicado em 14 de    julho, criticava não apenas a comissão de artes em termos gerais,    mas também determinados indivíduos, incluindo Girnus e Helmut    Holtzhauer, um dos principais membros da Kunst-kommission. Em 15 de julho Brecht    publicou Das Amt für Literatur, em que ele criticava diretamente    esse órgão de controle por publicar apenas obras "com idéias    com as quais o Departamento de Literatura está familiarizado através    dos jornais".37 Em Erros    não identificáveis da Comissão de Artes, ele criticou    duramente a Comissão. Nesse poema, ele afirmou que
os mais graduados membros da Comissão de Artes/Pagaram seu tributo ao nobre costume de/ acusar-se de certos erros, e/Murmuraram que eles também acusavam a si mesmos de certos erros. Entretanto/Quando interrogados sobre quais erros estavam falando eles julgaram impossível/ Lembrar qualquer erro específico. Tudo o que/ a Academia mantinha contra eles/Não tinha sido precisamente erro nenhum, pois a Comissão de Artes/nada tinha suprimido, mas apenas não o tinha promovido./ Apesar das mais zelosas ruminações/ Eles não conseguiam lembrar-se de nenhum erro específico, entretanto/ Eles insistiam com veemência que tinham/Cometido erros – como é de costume. (Brecht, Poems, p.436)
Em particular, Brecht continuava criticando vários    funcionários, incluindo Grotewohl e o ministro da Educação    Pública, Paul Wandel. Para Wandel ele escreveu que "a Comissão    de Artes deve ser dissolvida de forma ampla e completa". A Comissão tinha    transformado todos os artistas em seus inimigos, e também "conseguido    transformar os princípios mais progressistas em algo próximo do    descrédito". Brecht apontava que as tarefas administrativas da Comissão    podiam ser desempenhadas de melhor forma pelo "Ministério da Cultura,    e a Área Cultural do Partido da Unidade Socialista", que "poderiam exercer    uma influência de muito maior autoridade nas questões artísticas...    O que necessitamos agora é simplesmente deixar os artistas livres para    que eles possam produzir" (Brecht, 1981, p.520-1). Para Girnus, em uma reunião    particular em agosto, ele mais uma vez enfatizou sua reputação    internacional e também a do Berliner Ensemble. Nessa mesma reunião,    Brecht deu a Girnus um artigo para que fosse publicado no Neues Deutschland,    no qual ele reafirmava o direito da Academia de "exercer a crítica".    Ele apontava que a própria Academia tinha cometido erros e, portanto,    tinha minado a confiança de muitos artistas no novo estado, sem a qual    "nenhum estado novo pode ser construído". Um dos mais significativos    erros na política cultural, afirmava ele, era que a RDA tinha virado    as costas "cedo demais" para o "passado imediato" a fim de abraçar seu    futuro; entretanto, o futuro dependia da "libertação do passado".    Para que a RDA realizasse totalmente seu potencial, criasse uma "produtividade    geral de toda a nação", a arte teria de "criar um novo impulso".38
 Em poucos – mas decisivos – meses, Brecht conseguiu    atingir a maioria de seus objetivos. Em virtude do desequilíbrio após    17 de junho, Brecht, juntamente com Becher, convenceu Abusch e outros membros    da elite do partido a permitir que Huchel continuasse como editor do Sinn    und Form, a escolher a dedo os membros de uma comissão que o aconselharia    em relação ao conteúdo do jornal.39    Brecht abrandou o ataque a Eisler e o ajudou a escrever do próprio punho    um pedido de desculpas ao Comitê Central do SED. Eisler retornou à    RDA e reassumiu sua carreira, embora bastante moderado em razão desse    evento. Brecht também foi útil na substituição de    Das Amt für Literatur e de Die staatliche Kommission fur Künst – as    duas instituições criadas para coordenar uma campanha antiformalista    – por um novo Ministério da Cultura, liderado por seu amigo e aliado    Becher. Esse Ministério da Cultura foi estabelecido no início    de 1954, e pouco depois disso Brecht foi indicado para um conselho cuja responsabilidade    era "orientar" Becher em relação à política cultural.    Esse cargo era ideal para Brecht, que sempre preferia trabalhar nos bastidores.40    Como resultado disso, ele conseguiu, em curto espaço de tempo, influir    na política cultural – mantendo aliás alguma liberdade artística    – de uma forma direta. Finalmente, Brecht conseguiu uma sede permanente para    sua companhia teatral, o Schiffbauerdamm, em 1954.
 Apesar dessas conquistas, Brecht tem sido criticado    por sua recusa a apoiar as ações dos trabalhadores. A imagem que    surgiu de Brecht durante esse período crucial é marcada pela covardia    e por uma ética que promovia interesses pessoais. John Fuegi argumentou    que Brecht foi exposto como um "fiel comparsa dos carrascos" e que "sua posição    independente, a plataforma de oposição interior, de repente    revelou-se como uma ilusão grotesca". Ronald Hayman (1983, p.370) também    observa que Brecht apressou-se em "expressar um apoio cego aos dogmas da ortodoxia".    Essas críticas merecem consideração, mas Fuegi e Hayman    não levaram em conta a mescla de idealismo e oportunismo que influenciava    o pensamento de Brecht nesse momento. Suas ações em 1953 basearam-se    em várias considerações aparentemente contraditórias.    Interesse próprio, oportunismo e uma crença idealista de que a    RDA representava a melhor oportunidade para o futuro da Alemanha foram elementos    que desempenharam papéis complexos e inter-relacionados. Brecht não    achava que a crise era o fim da linha. Ele a considerava um "Blütezeit",    um tempo de florescimento. Não conseguia avaliar "os terríveis    acontecimentos de 17 de junho como simplesmente negativos" (GKBA, v.27,    346f.; ver também Brecht, Arbeitsjournal, 520). Freqüentemente,    Brecht parecia acreditar que a mudança só podia acontecer por    meio de uma crise. É possível observar isso, por exemplo, no seu    entendimento da crítica artística: "Quando critico uma obra...    eu a coloco em crise, ou seja, eu a critico. A obra tem de provar, na pior das    circunstâncias, que ela funciona como obra de arte" (BBA, 1340/61). A    nova RDA era para Brecht como uma obra de arte. Os acontecimentos em torno de    17 de junho a tinham colocado em crise, tinham provado que ela não estava    funcionando de forma adequada e, por isso, precisava ser melhorada (BBA, 2164/24).
 Fuegi, Hayman e outros também perderam    de vista o contexto da época. Eles supuseram que a crítica pública    ao programa do partido era uma opção viável em 1953 e que    fazer críticas teria provocado mudanças. Entretanto, a evidência    mostra claramente que aqueles que discordaram publicamente do programa do partido    sofreram severas punições. Brecht entendia as realidades políticas    e embora estivesse comprometido com alguns objetivos de longo prazo, teve de    improvisar e muitas vezes fazer acordos à medida que avançava.    Ele sabia, por exemplo, que não demonstrar apoio ao regime o teria privado    de toda influência como um agente cultural e provavelmente teria anulado    suas chances de conseguir o Theater am Schiffbauerdamm. Brecht também    entendia que uma sede permanente para sua companhia teatral era importantíssima,    mas não teria significado nada se ele não tivesse o controle da    produção artística. A maneira de realizar uma mudança    política e obter uma sede permanente para sua companhia foi, assim,    apoiar o regime em público e trabalhar nos bastidores.
 Isso não significou que Brecht não    se sentisse em conflito em relação a seus atos. Na verdade, existe    um número significativo de evidências anedóticas e literárias    – as Bukow Elegies e Turandot – de que Brecht sabia que não    tinha mantido uma distância crítica adequada em relação    ao regime. Ele escreveu os poemas e a peça, nenhum dos quais foi publicado    durante sua vida, enquanto refletia sobre os acontecimentos de 17 de junho.    Em "Trocando pneu", ele escreve: "Estou sentado à beira da estrada /    O motorista troca o pneu. / Eu não gosto do lugar de onde vim. / Eu não    gosto do lugar para onde vou. / Por que impacientemente o observo trocando o    pneu?". Em "Grandes tempos, desperdiçados", ele demonstra seu desapontamento    com o resultado daqueles dias de junho: "Eu sabia que cidades estavam sendo    construídas / Não estive em nenhuma delas. / Questão de    estatística, pensei eu / Não de história. // Para que servem    cidades, construídas / Sem a sabedoria do povo?". Talvez a passagem mais    sugestiva sejam as últimas linhas de "Terrível manhã":    "A noite passada, num sonho, vi dedos me apontando / Como se eu fosse um leproso.    / Os dedos estavam gastos pelo trabalho e / Eles estavam quebrados. // Vocês    não sabem! Eu soltei um grito agudo / Golpeado pela consciência"    (Brecht, Poems, p.439-40).
 A última peça de Brecht, Turandot,    também esclarece sua posição em 1953. Essa peça    não despertou muita curiosidade entre os historiadores, mas é    crucial tanto por trazer uma forma final à crítica feita por Brecht    aos intelectuais, crítica essa iniciada na década de 1930, como    também por ilustrar que Brecht reconhecia a opressão na RDA e    também o seu papel nessa opressão. No início de Turandot,    não há como conseguir algodão na China porque o imperador    e seu irmão, Jau Jel, detêm um monopólio. Eles estão    esperando que os preços subam, para que possam obter mais lucros. Os    fabricantes de roupas (Kleidermacher) e as pessoas que não têm    roupas (Kleiderlosen) começam a se unir em protesto. Kai Ho, um    ex-Tui que é a encarnação do comunismo, lidera uma insurreição.    Jau Jel convoca os Tuis para inventar elaboradas desculpas para a escassez de    algodão. Em essência, as maiores cabeças do reino estão    engajadas em uma competição de mentiras. O "maior enganador" vai    salvar o regime e receber a filha do imperador, Turandot, em casamento. Nenhum    dos diferentes competidores, que variam de Ka Müh, um personagem que se    assemelha a Camus, a Munka Du, que representa Adorno, consegue oferecer explicações    viáveis, e todos são executados. Gogher Gogh, uma figura semelhante    a Hitler que quer tornar-se Tui mas não passou no exame de admissão,    queima metade do estoque de algodão imperial debaixo do nariz dos Tuis    remanescentes, para que o restante possa ser vendido em um mercado em alta.    Em seguida, ele usa a força bruta para eliminar os Tuis e se casar com    Turandot. Mas antes de conseguir forçá-la, os adeptos de Kai Ho    intervêm (Brecht, 1968b).
 Em um nível, a peça é uma    crítica à tradição mandarínica de liderança    intelectual na Alemanha. Gogher Gogh é o monstro armado que saiu da cabeça    dos Tuis, a verdade das mentiras deles. Em outro nível, entretanto, Brecht    estava também ressaltando que os intelectuais de uma sociedade capitalista    – e a RDA, embora não fosse capitalista, também não era    totalmente socialista – só podem vender suas opiniões. Ele também    estava criticando a manutenção de um tipo de liderança    intelectual na RDA e sugerindo que as conseqüências haviam sido desastrosas.    A fim de criar a Bündnispolitik, foram privilegiados os intelectuais    burgueses, como ele. Em alguma medida, isso tinha sido necessário, mas    também teve conseqüências desastrosas. Dessa forma, Turandot    foi uma crítica da situação na Alemanha Oriental e uma    autocrítica. Brecht com certeza reconhecia que ele, também, tinha    se tornado um Tui; que ele, também, tinha acobertado as ações    do regime de Ulbricht.
As únicas figuras positivas na peça    são Kai Ho, representando um intelectual útil e engajado que,    por esse motivo, é excluído dos Tuis (Tellektuellen), e o velho    camponês Sen, personificação do pensamento prático    de Kai Ho. Sen observa que:
a injustiça reina em nossa terra, e na escola dos Tuis só se aprende porque deve ser assim. É verdade que pontes de pedra são construídas sobre os rios mais largos, mas elas levam os poderosos à indolência, e os pobres vagam sobre elas na condição de escravos. É verdade que existe um remédio, mas por meio dele as pessoas se curam para cometer injustiças, e os outros para serem escravizados. As pessoas compram opiniões como se compra peixe; dessa forma, o pensamento fica desacreditado.

O intelectual engajado deve, como Sen, mostrar    a realidade como ela é. Sem dúvida, Brecht gostaria de se ver    desempenhando esse papel, mas ele também sabia que tinha feito acordos    para atingir seus objetivos.
Se Brecht não pode ser visto inevitavelmente    como um vilão durante esse período, ele também não    pode ser propriamente chamado de herói, como Werner Mittenzwei tende    a caracterizá-lo. Brecht tinha escolhas e fez acordos. Ele não    precisava escrever cartas de apoio aos dirigentes da Alemanha Oriental e da    União Soviética. Ele poderia ter defendido os trabalhadores de    uma forma mais pública. Poderia muito bem ter escolhido deixar a RDA    e trabalhar para o socialismo em outro contexto. Mas, para uma pessoa como ele,    a idéia de mudar de lado naquele exato momento parecia quase impensável.    Porque exatamente naquele momento o governo da Alemanha Ocidental estava reabilitando    antigos nazistas em uma dimensão alarmante, fazendo a RDA parecer, em    contraste com isso, muito semelhante ao estado antifascista que sua interesseira    religião estatal proclamava ser. Brecht permaneceu em Berlim Oriental    porque estava comprometido com a RDA e pensava que poderia realizar alguma coisa    por lá, apesar de um aparelho de estado que era stalinista e muitas vezes    hostil a suas idéias sobre a arte política. Ele concordava em    termos gerais com as políticas da União Soviética e da    Alemanha Oriental, e fazia concessões que, segundo acreditava, eram justificadas    pela necessidade de combater a permanente influência do fascismo. Assim,    ele dedicou seus talentos e energia à criação de uma Alemanha    verdadeiramente socialista que ele confiava ao futuro, mesmo conhecendo, melhor    que a maioria das pessoas, os problemas que a Alemanha Oriental enfrentava naquele    momento. 
 De acordo com Rülicke, ele genuinamente    desejava "transformar o socialismo numa realidade". Ele sonhava com uma "nova    cidade", com um "novo povo", com o "melhor teatro" e os "melhores políticos",    onde se pudesse construir o socialismo. Após 17 de junho, Brecht esperava,    e muitas vezes ainda acreditava, que seu sonho "seria de fato realizado" (BBA,    2164/24-25). Por fim, isso o levou a colocar seu nome e seus talentos a serviço    de um estado político tacanho e opressor. Se Brecht tivesse vivido após    1956 e até o final da década de 1950, ele também poderia    ter ficado tão desencantado – e privado de seus direitos civis – quanto    outros antifascistas que retornaram do exílio para a RDA e mais tarde    deixaram o país, como Ernst Bloch e Becher. Mas em 1953 Brecht interpretou    a situação de forma diferente, e um exame cuidadoso das evidências    demonstra que isso pode ser interpretado não apenas como oportunismo    da parte dele, embora tenha claramente sido um erro de cálculo..
 Críticos como David Pike, Peter Davies    e Stephen Parker relegaram Brecht à irrelevância, afirmando que,    apesar das mudanças por ele obtidas em 1953, não teve uma influência    duradoura na RDA (Pike, 1993; Davies & Parker, 1998, p.181). Quando se considera    apenas a política cultural, essa acusação tem alguma validade.    Na esteira da Revolução Húngara, logo após a morte    de Brecht, a maioria dos intelectuais dissidentes foi presa, muitas vezes por    longos períodos, e toda a autonomia nas artes desapareceu. Mas a incapacidade    de Brecht para obter uma mudança duradoura na política cultural    não foi necessariamente o resultado da atitude assumida por ele em 1953.    Por alguns poucos anos, ele conseguiu reconquistar em certa medida a autonomia    nas artes, um feito notável naquele contexto. Além disso, ele    representava um tipo de intelectual que muitos futuros intelectuais da Alemanha    Oriental desejaram ser: comprometido com a liberdade artística, crítico,    disposto a correr riscos, mas não a colocar em perigo sua posição    (Rechtien, 1998, p.196ss).
 Contemporâneos afirmaram que a própria    instrumentalização de Brecht na década de 1950 foi uma    compensação bem-vinda e até mesmo indispensável    para o clima sufocante da RDA em relação à projetada cultura    socialista da nação alemã. O valor de mercadoria de Brecht    perdeu seu poder ao longo do tempo, mas sua crítica dos intelectuais    em relação à noção de "tuísmo" envolve    um modelo do intelectual público em que a auto-imagem do artista como    uma pessoa social e politicamente engajada correspondia às expectativas    do público. Partidário sem ser membro de um partido, independente    das instituições oficiais e mesmo assim experiente na sobrevivência    dentro das instituições, preparado para correr riscos e realizar    experimentos não convencionais – foi assim que Brecht acomodou um mundo    que ele concebia como mutável e introduziu algumas estratégias    poéticas e políticas para dar forma à sua concepção.
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