quinta-feira, 17 de março de 2016

Violência no Sudão do Sul denuncia a ONU

Violência generalizada torna crise do Sudão do Sul ‘uma das mais horrendas do mundo’, alerta ONU



Civis têm sido vítimas de inúmeras violações, como esquartejamentos, estupros coletivos e enforcamentos. Em um dos casos relatados à equipe da ONU, uma mulher foi amarrada a uma árvore e forçada a ver sua filha de 15 anos ser estuprada por dez soldados.
Situação dos direitos humanos no Sudão do Sul foi considerada uma das mais “horrendas” do mundo pelo ACNUDH. Foto: UNICEF Sudão do Sul / Sebastian Rich
Situação dos direitos humanos no Sudão do Sul foi considerada uma das mais “horrendas” do mundo pelo ACNUDH. Foto: UNICEF Sudão do Sul / Sebastian Rich
Um novo relatório do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) revelou nesta sexta-feira (11) episódios “horrendos” de crimes cometidos contra a população no Sudão do Sul e, em especial, por forças do governo. Para a agência da ONU, há motivos suficientes para considerar violações como “crimes de guerra” e “crimes contra a humanidade”.
O documento descreve casos de esquartejamento, de estupros coletivos e de civis sendo queimados vivos. De abril a setembro de 2015, mais de 1,3 mil casos de estupro foram relatados em apenas um dos dez estados do país, Unity, a província rica em petróleo.
Além dessas violações, civis a favor dos grupos de oposição também têm sido vítimas de outras atrocidades: são pendurados de árvores para morrerem enforcados, sufocados em contêineres, fuzilados ou obrigados a ver parentes sendo assassinados e violentados.
Uma mulher foi despida e estuprada por cinco soldados diante de seus filhos na beira de uma estrada e depois, em meio a arbustos, por outros homens. Quando o abuso terminou, suas crianças haviam desaparecido. Outra moça foi amarrada a uma árvore depois de testemunhar a morte do marido e teve que ver sua filha de 15 anos ser violentada por dez soldados.
Crianças têm sofrido o “peso” do conflito, sendo mortas, recrutadas para o combate, mutiladas ou abusadas, segundo a missão do ACNUDH que produziu o relatório após visita ao Sudão do Sul, de outubro de 2015 a janeiro de 2016.
O cenário do país levou o chefe de Direitos Humanos da ONU, Zeid Ra’ad Al Hussein, a afirmar que mulheres e meninas são tratadas como “mercadorias” pelos soldados que se deslocam entre as cidades da nação africana.
Para o secretário-geral assistente da ONU para Direitos Humanos, Ivan Šimonović, é preciso romper um ciclo de violência que se desenvolve historicamente. “O estupro é aceito” e acontece na presença de membros das famílias, destacou o dirigente, que disse ter visto mulheres serem forçadas a andar nuas pelas ruas, durante viagem pela nação africana.
Apesar de ser uma das “mais horrendas situações de direitos humanos do mundo”, crise não tem recebido atenção internacional, alertou Al Hussein.

Governo é maior responsável por violações cometidas em 2015; massacres são cometidos segundo motivos étnicos

Embora todas as partes do conflito, que começou em 2013, tenham cometido atos graves de violência sistemática contra civis, incluindo agressões sexuais, detenção arbitrária, sequestros, privação da liberdade e desaparecimento forçado, “a maior responsabilidade durante 2015” recai sobre agentes do Estado, devido ao enfraquecimento das forças de oposição.
Sempre que uma região muda de controle entre as entidades em guerra, os encarregados matam ou deslocam o maior número possível de civis, baseando-se em princípios étnicos.
O governo do Sudão do Sul tem praticado a tática da terra arrasada, devastando propriedades e meios de subsistência das cidades ocupadas por seu exército assim que o local é invadido por grupos rivais.
Crianças buscam abrigo num centro para proteção de civis na cidade de Malakal, atacada em fevereiro. Foto: ONU / Isaac Gideon
Crianças buscam abrigo num centro para proteção de civis na cidade de Malakal, atacada em fevereiro. Foto: ONU / Isaac Gideon
O relatório do ACNUDH recomendou que o Governo Transitório de Unidade Nacional deve impedir as violações assim que conseguir se estabelecer no país. O documento aconselha ainda a criação de tribunais híbridos, compostos por nacionais e estrangeiros, para julgar os crimes e garantir a responsabilização dos culpados.
Para o coordenador da missão da ACNUDH que visitou o país, David Marshall, líderes militares envolvidos nas atrocidades não devem integrar o Governo Transitório.

ONU vai investigar se resposta da Missão de Paz foi adequada em conflitos recentes, na cidade de Malakal

No mesmo dia em que o relatório do ACNUDH foi divulgado, as Nações Unidas anunciaram a abertura de um inquérito independente para apurar como integrantes da Missão da ONU no Sudão do Sul (UNMISS) reagiram aos conflitos que ocorreram em fevereiro, na cidade de Malakal.
O objetivo é determinar se as tropas conseguiram proteger civis que buscavam abrigo em bases da Missão, durante os ataques.
A vice-chefe humanitária da ONU, Kyung-wha Kang, visitou o local uma semana após os ataques e recebeu informações de que uma parcela da população foi assassinada e outra foi traumatizada e deslocada mais uma vez, após o centro para civis ter sido completamente queimado e destruído. Escolas e clínicas também foram arrasadas.
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) ressaltou também na sexta-feira (11) que confrontos recentes no estado de Equatoria Ocidental levaram mais de 11 mil pessoas a fugir do Sudão do Sul para a República Democrática do Congo, e outras 14 mil a buscar abrigo em Uganda. Estimativas indicam que cerca de 7 mil sul-sudaneses vivem como refugiados também na República Centro-Africana.

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